Bidu Sous: o blues das montanhas

19.11.2020 | 19h09 - Atualizada em: 19.11.2020 | 23h47
Leonardo Souza
Por Leonardo Souza
BIDUSOUS Foto: Danilo Ferrara Divulgação

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Giramundo

A cantora e compositora Bidu Sous está lançando seu álbum de estreia, "Don't Wake Me Up Early", todo dedicado ao blues.

Bidu Sous cresceu em São Francisco Xavier, um distrito de São José dos Campos, localizado entre as montanhas da Serra da Mantiqueira. Além dos atrativos naturais da pequena cidade, entre cachoeiras, trilhas e riachos, algo no lugar chama atenção: o blues.

A música sempre esteve presente na vida de Bidu desde pequena, ela cresceu ouvindo o pai - sanfoneiro, violonista, violeiro autodidata. Ainda menina, cantou na igreja dos 8 aos 19 anos de idade até finalmente descobrir o blues. Através de sua arte, Bidu conheceu o guitarrista angolano Nuno Mindelis, que a convidou para gravar backing vocals no álbum mais recente, "Angola Blues". No início do projeto de estreia, Bidu comentou com Nuno sobre a vontade de lançar seu primeiro single: "Anteriormente, em outras conversas sobre gravar um single, o Nuno me deu de presente uma música que que se chama 'Walk Away Baby', que ele já havia lançado em 1999... pretendo gravar essa releitura um dia!"

BDS14Imagem: Divulgação

Conversei com a artista sobre o lançamento. No bate-papo exclusivo, Bidu Sous comentou sobre o início, as referências musicais e o processo criativo do primeiro álbum, "Don't Wake Me Up Early".  

"Eu cresci ouvindo música de raíz e viola caipira. Aos 8 anos de idade, quando comecei a catequese, entrei no coral da igreja e só parei de cantar na igreja aos 19 anos. A música sertaneja e a música gospel foram minha grande escola. O primeiro contato com a música internacional veio através da TV e trilhas de filmes. Assisti “La Bamba" por diversas vezes, fiquei tocada com a história de Ritchie Valens! Eu devia ter uns 12 anos. E nessa época só ouvíamos música no rádio e toca fita. Uma lembrança muito forte que eu tenho é de mim dançando com o violão ao som de “Donna"! O violão era da minha altura! Eu o fazia de parceiro, isso sem meu pai saber é claro, o violão era proibido pra gente. Ficava pendurado num prego alto na parede... mas quando meu pai saía pra trabalhar eu dava um jeitinho de pegar. Músico autodidata, ele sempre recebia os amigos em casa pra fazer roda de viola e eu tava sempre por ali... ouvindo e cantando."

"O blues foi entrar na minha vida na adolescência... eu raramente andava com pessoas da minha idade, meus amigos eram na maioria pessoas mais velhas do que eu. E nessa eu ouvia o que eles ouviam... e gostava bastante... mas sempre fui curiosa e queria saber o que esses artistas tinham escutado pra chegar naquele som... e aí fui perguntando até descobrir quem influenciou nomes como os Rolling Stones e Eric Clapton... esse cara era o Muddy Waters... queria saber em quem a Janis Joplin se inspirava pra cantar 'Ball And Chain' daquele jeito com tanta alma e descobri, Big Mama Thorton, autora da música...  e assim foi... me apaixonei! Não sabia o que significavam as letras mas fui pega pela melodia."

"Quando assisti ao primeiro show de blues ao vivo, uma banda de SP que se chama “Irmandade Do Blues", eu pirei! Aí disse a mim mesma, 'quero cantar isso'. Perguntei ao guitarrista, na época o Edu Gomes, o que ele me aconselhava a ouvir para que um dia eu pudesse cantar blues. Aí ele me passou vários nomes; Billie Holiday, Nina Simone, Etta James, Koko Taylor."

"Antes de ter um trabalho dedicado ao blues, tive também uma banda country (minha primeira banda) e já fiz parte de duas bandas de reggae, como backing vocal. Dois estilos que também gosto muito, mas o blues falou mais alto. E assim escolhi essa estrada do blues que, embora esteja no começo, já tem me dado muitas alegrias! Amigos, realizações e incríveis parcerias!"

"Uma grande vitória pra mim é poder compartilhar meu primeiro álbum autoral, um disco de blues tradicional, produzido pelo guitarrista e produtor Lancaster Ferreira. Essa parceria foi um presente. Para a realização desse projeto pude contar com um grande time! Pessoas que tenho muita admiração como amigos e como músicos: Na guitarra: Lancaster Ferreira, guitarra slide: Lucas Espildora, baixo: Raoni Brascher, piano: Adriano Grineberg, gaita: Thiago Cerveira, bateria: Maurício Gaspar e arte de capa: Cainã Fontes. O Lan foi muito generoso comigo, mas esse privilégio não é só meu, ele tem uma mania maravilhosa de enxergar as pessoas, um cara que trabalha para a música com muita verdade e sentimento. Então o processo de realização desse projeto, do meu primeiro álbum, foi muito natural e muito especial. Com excessão de uma música, “Late Night Blues", todas as outras foram compostas para esse trabalho. O Lan escreveu as letras baseado nas histórias que eu contei, no que ele conhece de mim... e eu ajudei nas melodias. Nós queríamos que soasse bem vintage, ouvimos bastante os discos dos anos 1950, de Big Mama a Muddy Waters, pra ter uma referência de som. Quando falamos sobre fazer o álbum, o Lan me perguntou: 'Bidu você quer fazer um disco de sucesso ou um disco de blues?' Eu respondi - um disco de blues. Ele completou: 'Ah bom! Se me dissesse que queria um disco de sucesso eu não toparia porque o sucesso é imprevisível mas quando se faz algo de coração isso já nos realiza independente de qualquer outra coisa! E ainda corremos o risco de fazer sucesso!'

"E foi assim! Hoje esse disco é um sonho realizado! Eu sinto como se só agora eu existisse musicalmente! Esse álbum é o primeiro disco de blues tradicional lançado por uma mulher no Brasil! Eu me orgulho disso porque ainda vivemos num mundo muito machista, a cena blues ainda é muito machista, então eu tô muito realizada com esse trabalho. E se o BB King disse que não precisa ser negro e nem americano pra fazer blues... tá falado!!!"

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