Filme sobre assédio sexual na Fox News consegue fugir do maniqueísmo

17.01.2020 | 21h15 - Atualizada em: 20.01.2020 | 11h46
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"O Escândalo"

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Filme, que já está em cartaz nos cinemas brasileiros, concorre a três categorias no Oscar

Com um elenco de primeira linha e uma trama carregada de intrigas, sexo e poder,  "O Escândalo", de Jay Roach, que acaba de estrear no Brasil, trata do episódio que inaugurou, ainda em 2016, a série de denúncias de assédio sexual em torno das quais se articularam movimentos como MeToo e Time's Up.

Não é pouca coisa.

No ano da eleição de Trump, a apresentadora Gretchen Carlson (Nicole Kidman) acusou de assédio sexual a Roger Ailes (John Lithgow), criador e CEO da Fox News, canal mais visto, amado e odiado dos EUA.

Sua denúncia puxou uma fila de muitas outras, entre elas a de Megyn Kelly (Charlize Theron), célebre âncora do canal, e a da jovem evangélica Kayla, personagem ficcional vivida por Margot Robbie. 

O escândalo afastou Ailes da TV que havia criado à sua imagem e semelhança --conservadora, sensacionalista e com um especial apetite por apresentadoras de vestidos justos e curtos. Entre âncoras de extrema direita e funcionárias que se orgulham de dizer que não são feministas, estoura a bomba, evidenciando que Ailes usava seu poder para subjugar jornalistas em busca de projeção e sucesso.

Assim, enquanto a ambição de jornalistas homens os submetia ao crivo da competência, a ambição das mulheres as empurrava para um pedágio sexual na sala do todo-poderoso da emissora, a quem ninguém queria desagradar.

E, ainda que nesse tipo de caso seja inevitável usar o binômio vítima-algoz, "O Escândalo" consegue fugir do maniqueísmo mais rasteiro e dar nuances às personagens. Carlson só acusa o ex-chefe depois que é demitida. Kelly reluta em revelar que também foi alvo das investidas com receio de arruinar a carreira. Colegas mulheres fazem campanha a favor de Ailes, que é ele mesmo um tipo bonachão.

O frenesi dos bastidores da Fox News dá o ritmo acelerado do filme e, no contexto eleitoral, cria novas camadas de interesse que poderiam ter sido mais bem exploradas pelo diretor, que claramente não arrisca em nada.

A narrativa da sororidade é apresentada como solução, o que pode ser edificante e sedutor numa era de mulheres empoderadas, mas que não deixa de ser algo ingênuo. As denúncias derrubaram o poderoso chefão da Fox News, mas vieram outros chefes da mesma escola, levando a novos escândalos - os últimos de poucos meses atrás - que só evidenciam a vulnerabilidade feminina diante de instâncias de poder ainda dominadas por homens.

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